28 de fevereiro de 2007
Cadáver esquisito II
Quem escreve à noite diz hoje e ontem e sempre, acordes com luz do dia ou ao anoitecer, por mais inútil que te sintas, és bela e única. À luz do dia brilhas como cobre, duro e martelado, velho no tempo. Estás a ficar escura - há quem diga oxidada. Um dia, abriste os olhos e a luz era demasiado branca, mas furou o meu estômago feito chão, a terra vermelha que aqui não há, aquela de que fala o meu pai, que a mim não me dá paz, só o cheiro da terra molhada, e penso nela como um ser vivo e espero por um dia melhor. O adjectivo inibe-me. Prefiro o nome. Nomine. Abre a porta, deixa entrar, voa sem medo. Da próxima vez que vieres, traz um sorriso e a alma lavada, se fazes favor. E tudo o que disseres, quero que o sintas primeiro e que, por uma vez, me faças sentir especial. "Que eu te mostre que sou especial!". Raramente o dizemos, nem a nós próprios. Mas quando dizes adeus, de repente é a palavra mais usada. Até à exaustão. Em relação a ti. Até à tua náusea. Cansados como cavalos velhos, sem fôlego como adolescentes. Adolescentes somos sempre e iguais a nós mesmos, precisamos sempre de olhar os outros e de nos reconhecermos neles, mesmo que não seja fácil, e nunca é fácil, ao contrário do que nos fazem crer.
27 de fevereiro de 2007
Pernas cansadas, charutadas e pianadas
Quiseram os senhores de fato que a malta que “anda por fora” tivesse acesso à wireless da PT nos respectivos portáteis para mais rapidamente “despachar serviço”. Por causa disso, ando sempre com um desdobrável azul que me indica os locais onde posso ter acesso à dita net rápida sem fios nesta linda cidade de Lisboa.
Ora, excluindo por motivos óbvios as estações de serviço da Galp, os CTT, os cinemas Lusomundo e o Holmes Place, restam-me os mais de 40 hotéis, seis centros comerciais e sete cafés. Também há em três ou quatro jardins, mas enquanto não instalarem uma tomada nas plantinhas, não poderei ali ligar o meu PC, que a máquina anda com a bateria fraca.
Depois deste bonito intróito que serviu apenas para situar os leitores, passo ao que interessa. Hoje, mandei serviço do Tivoli, um cinco estrelas em plena Avenida da Liberdade, com um átrio bastante grande, cadeirões e sofás confortáveis ocupados por homens de negócios fumando charuto e descontraídos turistas de cabelo louro.
Entre gente para trás e para a frente ao telemóvel, conversas acesas sobre dossiers certamente de importância suprema, um casal de namorados a descansar as pernas antes do jantar e uns vinte engenheiros das telecomunicações (certezinha que eram) em grandes uísques e charutos (paga a empresa, certezinha) ninguém se dignou a olhar nem que fosse por instantes para o pianista que se afadigava a dar música àquele ambiente.
Eis que, depois de uma hora de grandes clássicos mal-amanhados, o pianista levanta-se devagar, arruma o banco no lugar, fecha a pasta com as folhas de música, dá uma olhadela rápida ao átrio enquanto abotoa o casaco, e pira-se.
A diferença, agora que se foi, é ouvirem-se melhor as gargalhadas dos turistas, os tlins dos copos nas mesas, e distinguirem-se o inglês e o espanhol das conversas.
O ambiente não melhorou por ele ali estar, nem piorou por se ir embora. Aqui está uma peça que gostava de fazer. Porque é que há pianadas nos átrios de hotéis e centros comerciais? Quem é que disse que a música ambiente é uma boa ideia? Porquê um pianista e não um violinista ou até um flautista? A plateia gosta? Os clientes queixam-se, aplaudem ou ignoram? O pianista aprecia o que faz? Porquê? No átrio do cinco estrelas da Avenida ou junto dos restaurantes no Atrium do Saldanha, os pianistas são camaleões. Confundem-se com o ambiente, não fazem mal nem agridem. Percebo que a sua função é serem invisíveis enquanto deixam sair a música. Mas…who cares?
Ora, excluindo por motivos óbvios as estações de serviço da Galp, os CTT, os cinemas Lusomundo e o Holmes Place, restam-me os mais de 40 hotéis, seis centros comerciais e sete cafés. Também há em três ou quatro jardins, mas enquanto não instalarem uma tomada nas plantinhas, não poderei ali ligar o meu PC, que a máquina anda com a bateria fraca.
Depois deste bonito intróito que serviu apenas para situar os leitores, passo ao que interessa. Hoje, mandei serviço do Tivoli, um cinco estrelas em plena Avenida da Liberdade, com um átrio bastante grande, cadeirões e sofás confortáveis ocupados por homens de negócios fumando charuto e descontraídos turistas de cabelo louro.
Entre gente para trás e para a frente ao telemóvel, conversas acesas sobre dossiers certamente de importância suprema, um casal de namorados a descansar as pernas antes do jantar e uns vinte engenheiros das telecomunicações (certezinha que eram) em grandes uísques e charutos (paga a empresa, certezinha) ninguém se dignou a olhar nem que fosse por instantes para o pianista que se afadigava a dar música àquele ambiente.
Eis que, depois de uma hora de grandes clássicos mal-amanhados, o pianista levanta-se devagar, arruma o banco no lugar, fecha a pasta com as folhas de música, dá uma olhadela rápida ao átrio enquanto abotoa o casaco, e pira-se.
A diferença, agora que se foi, é ouvirem-se melhor as gargalhadas dos turistas, os tlins dos copos nas mesas, e distinguirem-se o inglês e o espanhol das conversas.
O ambiente não melhorou por ele ali estar, nem piorou por se ir embora. Aqui está uma peça que gostava de fazer. Porque é que há pianadas nos átrios de hotéis e centros comerciais? Quem é que disse que a música ambiente é uma boa ideia? Porquê um pianista e não um violinista ou até um flautista? A plateia gosta? Os clientes queixam-se, aplaudem ou ignoram? O pianista aprecia o que faz? Porquê? No átrio do cinco estrelas da Avenida ou junto dos restaurantes no Atrium do Saldanha, os pianistas são camaleões. Confundem-se com o ambiente, não fazem mal nem agridem. Percebo que a sua função é serem invisíveis enquanto deixam sair a música. Mas…who cares?
22 de fevereiro de 2007
Tenho Um Primo Convexo
Tenho um primo convexo
Fadado para amnistias
Em torno de ele nadam
Plantas carnívoras
Agitando como plumas
As cordas violáceas
O meu primo dormita
Glu glu entre palmeiras
Suspenso numa rede
De suor e preguiça
Corvos bicam-lhe os pés
Trincam-lhe os calos
Enquanto a tarde jaz
E a mao suspende
O gesto de acordá-lo
E a terra treme
Mas de nada o meu primo se apercebe
Fadado para amnistias
Em torno de ele nadam
Plantas carnívoras
Agitando como plumas
As cordas violáceas
O meu primo dormita
Glu glu entre palmeiras
Suspenso numa rede
De suor e preguiça
Corvos bicam-lhe os pés
Trincam-lhe os calos
Enquanto a tarde jaz
E a mao suspende
O gesto de acordá-lo
E a terra treme
Mas de nada o meu primo se apercebe
zeca afonso
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19 de fevereiro de 2007
Patas pretas
13 de fevereiro de 2007
um fadinho do chico
Oh, musa do meu fado
Oh, minha mãe gentil
Te deixo consternado
No primeiro abril
Mas não sê tão ingrata
Não esquece quem te amou
E em tua densa mata
Se perdeu e se encontrou
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um imenso Portugal
Sabe, no fundo eu sou um sentimental
Todos nós herdamos no sangue lusitano uma boa dose de lirismo
Mesmo quando as minhas mãos estão ocupadas em torturar, esganar,trucidar
Meu coração fecha aos olhos e sinceramente chora...''
Com avencas na catinga
Alecrins no canavial
Licores na moringa
Um vinho tropical
E a linda mulata
Com rendas do Alentejo
De quem numa bravata
Arrebato um beijo
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um imenso Portugal
Meu coração tem um sereno jeito
E as minhas mãos o golpe duro e presto
De tal maneira que, depois de feito
Desencontrado, eu mesmo me contesto
Se trago as mãos distantes do meu peito
É que há distância entre intencão e gesto
E se o meu coração nas mãos estreito
Me assombra a súbita impressão de incesto
Quando me encontro no calor da luta
Ostento a aguda empunhadura à proa
Mas o meu peito se desabotoa
E se a sentença se anuncia bruta
Mais que depressa a mão cega executa
Pois que senão o coração perdoa''
Guitarras e sanfonas
Jasmins, coqueiros, fontes
Sardinhas, mandioca
Num suave azulejo
E o rio Amazonas
Que corre Trás-os-Montes
E numa pororoca
Deságua no Tejo
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um imenso Portugal
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um imenso Portugal
isto tudo para dizer que dava o dedo mindinho do pé para estar em madrid a ver o chico buarque a cantar este fado com o carlos do carmo e com o júlio pereira no bandolim.
Oh, minha mãe gentil
Te deixo consternado
No primeiro abril
Mas não sê tão ingrata
Não esquece quem te amou
E em tua densa mata
Se perdeu e se encontrou
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um imenso Portugal
Sabe, no fundo eu sou um sentimental
Todos nós herdamos no sangue lusitano uma boa dose de lirismo
Mesmo quando as minhas mãos estão ocupadas em torturar, esganar,trucidar
Meu coração fecha aos olhos e sinceramente chora...''
Com avencas na catinga
Alecrins no canavial
Licores na moringa
Um vinho tropical
E a linda mulata
Com rendas do Alentejo
De quem numa bravata
Arrebato um beijo
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um imenso Portugal
Meu coração tem um sereno jeito
E as minhas mãos o golpe duro e presto
De tal maneira que, depois de feito
Desencontrado, eu mesmo me contesto
Se trago as mãos distantes do meu peito
É que há distância entre intencão e gesto
E se o meu coração nas mãos estreito
Me assombra a súbita impressão de incesto
Quando me encontro no calor da luta
Ostento a aguda empunhadura à proa
Mas o meu peito se desabotoa
E se a sentença se anuncia bruta
Mais que depressa a mão cega executa
Pois que senão o coração perdoa''
Guitarras e sanfonas
Jasmins, coqueiros, fontes
Sardinhas, mandioca
Num suave azulejo
E o rio Amazonas
Que corre Trás-os-Montes
E numa pororoca
Deságua no Tejo
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um imenso Portugal
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um imenso Portugal
isto tudo para dizer que dava o dedo mindinho do pé para estar em madrid a ver o chico buarque a cantar este fado com o carlos do carmo e com o júlio pereira no bandolim.
11 de fevereiro de 2007
7 de fevereiro de 2007
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